Mais de 330 milhões de pessoas visitaram os parques naturais norte-americanos em 2016 e 2017, um número recorde que equivale à população do país. As consequências ambientais (e não só) são alarmantes e a culpa é das redes sociais.

#instagramfamous. A hashtag («etiquetas» usadas nas redes sociais que identificam tópicos de assuntos) talvez não diga muito à maioria dos leitores à primeira vista. Mas se pensar nos milhares de turistas que diariamente são despejados em frente ao Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, ou na Livraria Lello, no Porto, munidos de um smartphone que aponta para tudo o que mexe, então poucos habitantes destas cidades não terão sentido os efeitos colaterais dos locais marcados pela hashtag #instagramfamous: locais célebres inundados por (literalmente) milhões de visitantes cujo propósito, mais do que conhecer, é mostrar que lá estiveram. E a maneira mais eficaz de o provar é através de uma fotografia. Ou de centenas delas. Que logo em seguida são publicadas numa das redes sociais da moda.

Pai, esqueci-me do smartphone!

O modo como os fluxos maciços de turistas estão a alterar os espaços e as paisagens de locais célebres, de Barcelona ao Taj Mahal, de Machu Picchu à Antártida, ganhou uma dimensão global nos últimos anos e as redes sociais parecem estar no «olho do furacão» deste fenómeno. Mas nos parques naturais norte-americanos, locais que reverberam no imaginário de diversas gerações que ao longo dos anos, através do cinema e da televisão, familiarizaram-se com locais como o Grand Canyon ou a Montanha Rochosa, o problema é particularmente relevante. Em 2016 e 2017, estes parques foram visitados por mais de 330 milhões de pessoas, um número recorde que praticamente equivale à população dos Estados Unidos da América.

Veja-se Horseshoe Bend, no estado do Arizona, em pleno deserto do fotogénico Oeste norte-americano, perto do Grand Canyon, com uma vista de sonho sobre o rio Colorado.

Vale bem a fotografia: Horseshoe Bend e o rio Colorado

Visitado anualmente, em média, por alguns milhares de turistas até ao final da primeira década do presente século, o número de visitantes disparou em 2010, quando atingiu as 100 mil pessoas. Em 2017, Horseshoe Bend recebeu 750 mil visitantes. Este ano, as previsões apontam para 2 milhões de turistas. O que mudou a partir de 2010? Talvez a criação do Instagram nesse ano levante a ponta do véu sobre a resposta.

Um problema mortal e não só

O peso esmagador do turismo de massas tem várias faces, inclusive a trágica. A vítima mais recente da imprevidência dos visitantes de Horseshoe Bend em busca da melhor fotografia ocorreu em maio. Em novembro, no Grand Canyon, um casal morreu devido a uma queda que terá sido provocada por uma selfie.

Tudo pelas redes sociais, nada contra as redes sociais

Qual é então o custo para obter fotografias icónicas? Além das ocasionais tragédias, o cenário não poderia ser mais desolador para aqueles que (ainda) procuram uma experiência de contacto contemplativa e tranquila com a natureza: poluição atmosférica e sonora devido ao aumento da circulação automóvel; filas de 2 a 3 horas para entrar no parque de Yosemite Valley, na Califórnia, durante o verão; contactos inadequados e incidentes com a fauna e flora; 90% de aumentos de acidentes de viação e 130% de resgastes em Yellowstone, um parque famoso distribuído pelos estados de Wyoming, Idaho e Montana; agressões no parque de estacionamento do parque de Glacier, no estado de Montana; dejetos humanos a céu aberto; toneladas de lixo deixados em locais cujos sistemas de recolha são naturalmente limitados. Só na Montanha Rochosa, no estado do Colorado, são usados 3 mil quilómetros de papel higiénico anualmente.
Os impactos do fluxo turístico são tão avassaladores que há locais que correm o risco de pura e simplesmente desaparecerem, como as quedas de água de Kanarraville, no Utah, que em alguns anos passou de um local praticamente reservado para os 350 habitantes daquela localidade para um destino turístico popular que atraiu mais de 40 mil visitantes em 2015.
Será que a incessante procura por parte dos turistas excede a capacidade de resposta destes locais, naturalmente frágeis e preservados fora de comunidades humanas significativas? Tendo em conta os números históricos de visitas aos parques naturais, a questão é pertinente. Só Yellowstone, o parque natural mais antigo do mundo, registou 4 milhões de visitas em 2017.

Onde estamos mesmo?

Os parques naturais não parecem ter sido concebidos para receber tantos visitantes, sobretudo quando o investimento público na modernização dos parques naturais norte-americanos está «congelado» há vários anos. Estima-se que o valor necessário para as obras de manutenção nesses parques se cifre em onze mil milhões de dólares.
Quanto tempo é que os turistas vão levar a percebê-lo?